Desde há décadas que as drogas pesadas se tornaram um problema de saúde pública global. Isto deve-se aos efeitos viciantes e negativos que as drogas têm sobre o corpo, mente e espírito. Mas qual é a realidade em Portugal a este respeito? E como o consumo de drogas afeta o mercado de trabalho nacional?
Neste artigo mencionamos os últimos dados conhecidos, alertando para os perigos do uso de drogas e os seus efeitos na saúde física, mental e social.
Segundo os dados mais recentes, a mortalidade relacionada com consumo de drogas continua a crescer em Portugal. Em 2021, registaram-se pelo terceiro ano consecutivo mais overdoses no território nacional, mais concretamente 74, com os números a dispararem 45% face a 2020, atingindo o número mais alto desde 2009.
De acordo com informações veiculadas pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) a evolução negativa em alguns indicadores da situação do país em matéria de drogas, toxicodependências e álcool tem criado alarme na sociedade.
Em 2019 registaram-se 63 mortes por overdose, aos quais se somaram outros 262 óbitos por outras causas de morte e que apresentaram resultados toxicológicos positivos. Outros dados evidenciam que as overdoses de opiáceos duplicaram entre 2017 e 2018 e as de cocaína subiram nos últimos anos.
Todos os agentes envolvidos, desde as forças policiais ao médicos que oferecem tratamentos sem esquecer as autarquias e entidades empregadoras, concordam que existe um recrudescimento do uso de drogas e de tráfico e atividades conexas, com grande visibilidade na área de Lisboa e Porto.
Apesar das políticas de Portugal serem consideradas uma referência internacional no tratamento da toxicodependência, os parâmetros atuais apontam para uma maior circulação de drogas no mercado nacional numa conjuntura de grandes desafios, como o crescente uso da Internet na comercialização de diversas substâncias psicoativas, eventuais alterações ao nível da produção interna de canábis e do papel do país nas rotas do tráfico internacional.
São vários os fatores que têm contribuído para estes resultados trágicos: após as restrições provocadas pela pandemia de Covid-19 o consumo aumentou em Lisboa e Porto, os serviços de tratamento não têm meios para responder a todos os pedidos de ajuda e as redes de tráfico estão cada vez mais sofisticadas.
Existem assim cada vez mais pessoas a consumir em condições muito precárias, sendo que muitas delas derivam da situação de crise económica instalada na sociedade portuguesa. Ou seja, o agravamento das condições de vida provocado pela pandemia e pela inflação provocou quase imediatamente o crescimento do consumo de droga como há muito tempo não acontecia.
Em Portugal, o perfil dos consumidores corresponde sobretudo homens entre os 25 aos 34 anos ou dos 35 aos 44, com um uso mais continuado. No caso da heroína a faixa etária é superior, sendo muitos deles antigos utilizadores que voltaram ao vício, mas também existem cada vez mais jovens.
Em Lisboa e Porto, os bairros sociais vivem um verdadeiro flagelo que afeta milhares de famílias. Em parte, porque os serviços de tratamento da toxicodependência não estão a conseguir responder ao agravamento do fenómeno após anos de desinvestimento que reduziram as equipas ao mínimo.
No ano passado, estiveram em tratamento 23.932 utentes com problemas relacionados com o uso de drogas no ambulatório da rede pública, referem os dados, salientando que, dos 3.236 utentes que iniciaram tratamento, 1.538 eram readmitidos e 1.698 novos utentes.
Na rede pública e licenciada registaram-se 440 internamentos relacionados com o uso de drogas em Unidades de Desabituação (mais 45% relativamente a 2020) e 1.980 em Comunidades Terapêuticas (+8%), correspondendo a 52% e 56% do total de internamentos nestas estruturas.
Apesar da heroína continuar a ser a droga principal mais referida entre os utentes em ambulatório e nas Unidades de Desabituação, no caso dos utentes das comunidades terapêuticas e dos novos utentes em ambulatório, a cocaína e a canábis são predominantes.
Em 2021, os consumos recentes de droga injetada variaram entre 3% e 14% nos vários grupos de utentes em tratamento, e as práticas recentes de partilha de seringas totalizaram entre 9% e 28% nos consumidores de drogas por via injetável.
O pior mesmo, neste cenário, é que a heroína, que nos anos 80 e 90 provocou o estereótipo das pessoas destruídas fisicamente, está a dar lugar ao crack com cada vez mais intensidade. Este tipo de droga, que corresponde à mistura de cocaína cozida com amoníaco ou bicarbonato, tornou-se a substância psicoativa dominante. O que é extremamente preocupante.
A verdade é que a destruição física que o crack provoca é muito agressiva e a inexistência de tratamento faz certamente a diferença entre a vida e a morte. O crack é uma droga que provoca uma adição muito rápida e que destrói rapidamente, mas existem muitas outras. Esse é aliás um dos factores decisivos para o aumento do consumo, pois nunca existiram tantas drogas disponíveis.
Conforme afirmam os especialistas, quase tudo pode ser usado como droga, permitindo associações entre substâncias clássicas, novas composições e medicamentos. Assim, a atualidade neste panorama é caracterizada pela utilização de várias substâncias em simultâneo, ou em alternância.
Muitos consideram que a culpa também reside no facto do poder político ter-se convencido que o problema da droga estava resolvido em Portugal e, por essa razão, deixou de prestar a atenção que o problema merece. Já em fevereiro de 2023, o diretor-geral do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Dependências afirmou que a situação de consumo e tráfico de droga a que se assiste em algumas zonas do Porto e LISBOA, por exemplo, resulta da má avaliação da destruição do bairro do Aleixo e do pouco investimento social.
De forma genérica, João Goulão afirmou numa entrevista à RTP que se instalou um silêncio excessivo sobre as drogas em Portugal, pelo que defende que é preciso relançar o tema da criminalização do consumo em espaço público.
É um facto indesmentível que o consumo de droga em Portugal está a aumentar, o que provoca também alerta nas empresas, já que, apesar de muitos consumidores estarem desempregados, a maioria da população ativa trabalha diariamente, arrastando para o local de trabalho comportamentos e atitudes menos próprias.
O trabalhador típico perde 3 semanas de trabalho (15 dias) anualmente por doença, ferimentos ou outras razões que não sejam férias e feriados. Os trabalhadores com distúrbios de uso de substâncias, contudo, faltam mais duas semanas por ano do que os seus pares, com uma média de quase cinco semanas (24,6 dias) por ano.
A maioria destes dias extra de trabalho em falta está associada a doença e lesão. Os trabalhadores em recuperação (que relataram ter recebido tratamento de uso de substâncias no passado e não tiveram uma desordem de uso de substâncias nos últimos 12 meses) falham os dias mais curtos de qualquer grupo – mesmo os trabalhadores em geral – aos 10,9 dias.
Do ponto de vista dos empregadores, entender o fenómeno pode ajudar consideravelmente na prevenção de acidentes de trabalho, assim como estimular o apoio aos seus trabalhadores. Por isso mesmo elaboramos em baixo algumas perguntas e respostas frequentes que permitem iniciar a compreensão sobre este problema.
O que são drogas pesadas?
As drogas pesadas são substâncias sintéticas cujos efeitos têm um grau de toxicidade mais elevado do que outros medicamentos. Estas drogas podem alterar o estado físico, mental, emocional e social do utilizador. Alguns dos diferentes tipos de drogas pesadas incluem cocaína, ecstasy, heroína, crack e drogas similares.
Efeitos físicos de drogas pesadas
O consumo de drogas pesadas pode ter efeitos extremamente negativos porque contêm substâncias químicas cujos perigos não são totalmente compreendidos. Alguns destes efeitos físicos incluem problemas cardiovasculares, deficiências do sistema imunitário, diminuição da força muscular, inflamação dos órgãos internos e morte prematura, o que num cenário profissional aumenta substancialmente os riscos.
Muitos medicamentos pesados também perturbam o ritmo cardíaco normal, o que pode causar palpitações ou tensão arterial elevada.
Consequências psicológicas do uso pesado de drogas
O uso de drogas pesadas está também associado a problemas psicológicos tais como ansiedade, depressão e distúrbios de comportamento social. As drogas pesadas podem alterar o funcionamento normal do cérebro, o que em alguns casos pode levar a alucinações, paranóia e raiva. Estas substâncias também suprimem os efeitos naturais do neurotransmissor serotonina, levando a sintomas de baixo humor e depressivos.
Mais uma vez, se tal acontece no local de trabalho o perigo aumenta não apenas para os outros trabalhadores, mas para as próprias instalações laborais.
Conceito de toxicodependência pesada
A toxicodependência grave é uma perturbação mental caracterizada pelo abuso persistente e problemático de uma substância ilegal, obtida para fins recreativos ou motivada pela dependência.
Isto pode ocorrer quando o utilizador experimenta efeitos compensadores ao utilizar a substância e acredita que não é capaz de controlar a utilização. Quando uma pessoa abusa destas drogas, começa a experimentar sintomas associados, tais como alterações de comportamento e pensamento, consequências negativas para a saúde física e mental, crises emocionais recorrentes e dificuldades em restaurar os padrões normais de funcionamento.
Há uma variedade de tratamentos para ajudar os toxicodependentes de drogas pesadas a recuperar o funcionamento normal. Estes tratamentos podem incluir terapia individual ou de grupo, apoio centrado na abstinência, medicamentos como os antipsicóticos e antidepressivos para contrariar os efeitos secundários do uso de drogas pesadas, assim como a supervisão médica para gerir os sintomas relacionados com o uso de drogas.
Para prevenir o abuso de drogas pesadas é importante minimizar o acesso a estas substâncias e educar a população sobre os seus perigos potenciais.
O vício é um problema para todos os trabalhadores em Portugal, sendo impossível aferir, devido à falta de estudos, como o uso de substâncias está a afetar a força de trabalho. Por exemplo nos EUA o Conselho de Consultores Económicos da Casa Branca calculou que só a crise dos opiáceos custou à economia cerca de 696 mil milhões de dólares em 2018.
Num inquérito do Conselho Nacional de Segurança, 86% dos empregadores norte-americanos estavam preocupados com o impacto negativo do uso de opiáceos no local de trabalho, e 74% estavam preocupados com o impacto negativo da heroína e do fentanil no mesmo cenário.
Mais de 75% dos empregadores foram afetados de alguma forma pelo uso de opiáceos por parte dos empregados, com 38% a sofrer impactos relacionados com o absentismo ou o desempenho deficiente dos trabalhadores.
Estes números são preocupantes e, se tal acontece nos EUA, não será difícil acreditar que o mesmo aconteça em Portugal em números proporcionais. Existem no entanto medidas práticas que as empresas podem tomar para encarar este problema.
Diversos documentos informativos da União Europeia referem que “o consumo excessivo de álcool/drogas constitui um problema para uma percentagem significativa da população ativa. Dependendo dos países, dos setores e das profissões, as estatísticas sugerem que 5% a 20% dos trabalhadores sofrem, ou correm o risco de vir a sofrer, de dependência do álcool. As informações sobre a presença de drogas no local de trabalho são mais escassas”.
A realização de exames ou testes no trabalho para despistar álcool ou drogas no organismo dos trabalhadores apenas encontra justificação na proteção da segurança e saúde do trabalhador e de outros, nomeadamente na segurança dos colegas de trabalho conforme estipula o artigo 19º do Código do Trabalho.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) entre 15 a 30% dos acidentes de trabalho mortais são devidos ao consumo de álcool e drogas. O uso e abuso de álcool e droga é antes de mais uma questão de saúde e de prevenção.
No entanto, os empregadores podem tomar medidas simples para se protegerem a si próprios e aos seus empregados, como por exemplo:
Este é um tema que, por inerência de funções, deve ser perseguido pelas autoridades na matéria nas empresas – Segurança, Saúde Ocupacional & Recursos Humanos – de acordo com o plasmado na Diretiva Europeia existente e nomeadamente na Lei nº 102/2009 – Regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, que devem implementar regulamentos para a despistagem permanente destas adições, particularmente perigosas para a saúde, segurança e produtividade, em fase de crescendo, usando métodos adequados e sempre com cariz evidencial, o que a não acontecer as coloca em incumprimento dos seus deveres.
Os métodos aplicados recomendados são aqueles que recorrem a instrumentação para análise e impressão dos resultados através de matrizes biológicas consistentes, por exemplo a saliva, para acautelarem mesmo a proteção de dados, dada a persistência destas drogas no organismo, cujas janelas temporais variam de 9 horas quando analisadas pela saliva a 3 dias pela urina, 15 dias pela sangue ou mesmo, de forma eterna, pela queratina, razões que podem ser consideradas intrusivas da vida pessoal de cada trabalhador e por tal razão podem ser entendidas como ilegais ou inválidas, anulando todo o investimento feito para este controlo.
Em conclusão, podemos afirmar que os empregadores podem ainda não saber por onde começar para implementarem ou garantirem ambientes de trabalho isentos de drogas. Mas essa é uma necessidade cada vez mais premente em Portugal.